Três diálogos
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COMANDANTE: O homem está lá em cima! Vai, vai, vai!
Barulhos de passos pesados, coturnos em compensados de madeira, seguidos de portas sendo derrubadas. Como acompanhamento visual, lanternas montadas em rifles, rodando rapidamente como pequenos holofotes em uma festa em que ninguém foi convidado.
COMANDANTE: Enfim, depois de dezessete anos, finalmente vou poder colocar minhas mãos no temível Bananinha! Ele me enganou por muito tempo, tempo demais, mas ele sabia que esse jogo não iria durar para sempre. Pois a justiça, ah, a justiça — clama aos céus — a Justiça sempre recai sobre aqueles que menos a esperam!
SOLDADO: Comandante, com quem o senhor tá falando?
COMANDANTE: Porra 37, tá fazendo o quê ainda aqui embaixo? Corre lá pra cima, cerca o perímetro, faz alguma coisa útil, porra!
Interrompendo o diálogo, um homem de menos de um metro de altura corre entre as pernas dos homens fardados e pesadamente armados, trajando pantufas de jacaré, segurando uma Bíblia Sagrada na mão esquerda e uma furadeira Black & Decker na direita, e nada mais.
COMANDANTE: Abelardo, isso foi LONGE DEMAIS! Você não tem m– Quer saber, deixa, faço eu mesmo essa porra — munido de seu S&W 686, descarregou todo o tambor na pequena figura.
SOLDADO: Comandante, pessoal da imprensa tá ai fora. O que a gente fala pra eles?
COMANDANTE: Manda todo mundo embora, 37. Essa gente precisa aprender a ter um mínimo de respeito de vez em quando.
O homem sai da sala, deixando seu superior sozinho. O comandante segura com uma mão um porta retrato antigo, no qual se viam dois rapazes, um no colo do outro, se beijando apaixonadamente: LEMBRANÇA DE OSASCO, 1983. Com a outra mão, pressiona uma pantufa manchada contra o rosto, involuntariamente enxugando suas lágrimas.
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Três sujeitos bebem em um cais. A maresia e o aroma perfumadamente fétido de vida em decomposição, característico da região — e impulsionados pelo calor da tarde — se encontravam em perfeita harmonia com o gosto punitivo da malvada. Como se, parando para prestar atenção, o rasgo incendiário que fazia no seu trajeto pela garganta proporcionasse toda a adstringência de um Camembert, ou um Gruyére, nesse queijos e vinhos impromptu em que o vinho selecionado da vez seria as reclamações de Jurandir.
JURANDIR: Aí quando fui abrir o, o pacote lá, tinham quantos? Três, sim, não cinco, como o filho da puta falou. Aí eu já como, peguei o telefone e na mes–
GUSTAVO: Caralho Dico, ninguém se importa, cara, puta que pariu. Cê tá ligado que a gente tá aqui a umas — O rapaz puxa o celular do bolso, o confere e prossegue com moções exageradas — duas horas! E você não calou a porra da boca, e, e o Menê, o cara que tá realmente fodido e precisando da gente, tu só ignorou o cara — tu é muito chato, cara.
O terceiro homem esfrega os olhos com a barra da saia, em um esforço subreptício em parecer mais injustiçado do que já se tinha conhecimento
MENELAU: N-não, Gu. Tá tudo bem… Eu quis vir pra cá pra não pensar nessas coisas mesmo, ele não tá incomodando não, de verdade — Diz enquanto opta por disfarçar a voz trêmula com um gole da garrafa de líquido transparente.
O primeiro homem, com uma expressão caricaturalmente ofendida, levanta-se com movimentos tronchos, entrega a garrafa para o segundo, se põe na beira do cais com tábuas maltratadas pela erosão e abre a braguilha.
GUSTAVO: Porra Dico, que que tu tá fazendo cara? Pra que mijar na porra da praia?
Com uma modulação de voz grave e contundente, profere para a distância, enquanto sacode seu membro e rebola a pélvis em padrões amplos, mas incisivos:
JURANDIR: Eu tô mijando em cima do Estado Brasileiro!
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MENINA: Pai, o que é impulsão?
PAI: Impulsão? Hm, pra explicar isso você precisa saber o que é impulso. Você sabe o que é impulso?
MENINA: [hesitante] Hummm… não.
PAI: Bem, imagina que você — o pai junta os pés e fala olhando para baixo — salta daqui, e vai assim pra frente. Você vai chegar daqui até ali, numa certa distância, certo?
MENINA: Uhum.
PAI: Então, isso e o impulso. Mas se você — o pai gesticula, sacudindo os braços com energia — vem correndo e aí uou, pula desse mesmo ponto, você vai chegar mais longe, né?
A garota concorda de boca fechada, com fronte séria.
PAI: Então, um impulsão é quando você corre muuuuuito, e daí consegue pular muuuito alto, e aí chega mais longe. Um impulsão.
MENINA: Ahhhhh — a garota move lentamente a cabeça, como constatando uma coisa tão trivial que, em situações futuras – e em uma idade mais orgulhosa – relutaria em admitir ignorância, dizendo algo como “Ah, eu sabia, tinha me esquecido”.
MÃE: Ricardo.
PAI: Que foi?
MÃE: Para com isso e explica direito pra menina.
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